"The Transformation Book or Book of Tasks" é a mais recente edição nascida da investigação de Nuno Ribeiro e Cláudia Souza, conhecidos Pessoanos nos campos da Filosofia e Psiquiatria em Pessoa.
O volume apresenta um dos projectos de Pessoa, nomeadamente um "livro" que conteria escrita de quatro pré-heterónimos: Alexander Search, Pantaleão, Jean Seul de Méluret e Charles James Search. Trata-se de um volume que começa a ser projectado em 1908 - um dos anos fundamentais para Pessoa, pois é quando começa a viver sozinho, mas também quando ocorrem grandes mudanças sociais com o assassinato do Rei D. Carlos em Lisboa - como um livro de "mudança".
É enquanto "livro de mudança" que realmente o projecto melhor impacta o leitor. Será um dos muitos projectos ainda por revelar do espólio inédito, enquanto volume próprio embora semi-completo. Nesta perspectiva torna-se essencial para compreender o estado de espírito de Pessoa nos primeiros anos em Lisboa, sobretudo depois do Regicídio. O abandono do Curso de Letras levou-o a considerar a saída do país, mas é provavelmente a inquietação social (e a influência do seu tio Henrique Rosa) que o convencem do contrário, apesar da falta de amizades e estranheza em pertencer.
Os editores apresentam-nos uma edição difícil. Não porque os conteúdos sejam difíceis de entender mas antes porque se torna algo difícil de compreender a própria relevância do livro enquanto unidade externa. Este é um dos maiores riscos em editar Pessoa - será que o próprio autor consideraria o volume relevante? Na nossa opinião o volume está no limite dessa fronteira, mas apenas porque nos dá indícios de grande interesse sobre posteriores intervenções de Pessoa, nomeadamente os primeiros artigos na Águia em 1912. Sabemos, com cada vez maior clareza, que o Pessoa de 1908-12 é um jovem profundamente sonhador e interventivo, a clamar por mudança e sem pudor em avançar culpados pela estagnação do país.
Mas convenhamos que um livro onde Search começa por falar do Regicídio para depois debater o racionalismo e acaba em estranha discussão sobre a loucura de Jesus é um livro que pouca mudança poderia trazer. A mesma coisa acontece com Pantaleão, que escreve sobre uma espécie de psicose colectiva que invade o país, ou com Jean Seul desenvolvendo o tema do exibicionismo e da queda da civilização Francesa... O fio condutor de todos estes textos é ténue mas não invisível - é evidente que existem aqui temas que serão recuperados mais tarde e que mostram Pessoa enquanto grande pensador e não enquanto grande poeta (embora aqui também se achem esses exemplos, como a tradução exímia de sonetos de Camões para Inglês por C. J. Search).
Penso que não seja um acaso que Pessoa não terá tido grande preocupação em avançar com a publicação do livro na forma em que o projectou. Este livro deve ser visto apenas como um prolegómeno para outros escritos posteriores, nomeadamente os artigos da Águia em 1912. O grande valor do volume é assim, não o da unidade, mas o de nos poder revelar um Pessoa mais pensador que poeta, precisamente quando se inicia a sério na língua Portuguesa. Lembre-se que os seus primeiros textos editados em Português são textos que pouco ou nada têm de poéticos, são muito mais sociológicos e antropológicos. Se este livro reforçar essa noção de Pessoa enquanto pensador e não só poeta, terá com certeza feito um imenso serviço à herança cultural do autor. Pensamos que seja o caso.
Acedam aqui a uma amostra do conteúdo do volume. Esta obra pode ser adquirida aqui.
Um agradecimento aos autores pela cedência de um exemplar para análise.
O volume apresenta um dos projectos de Pessoa, nomeadamente um "livro" que conteria escrita de quatro pré-heterónimos: Alexander Search, Pantaleão, Jean Seul de Méluret e Charles James Search. Trata-se de um volume que começa a ser projectado em 1908 - um dos anos fundamentais para Pessoa, pois é quando começa a viver sozinho, mas também quando ocorrem grandes mudanças sociais com o assassinato do Rei D. Carlos em Lisboa - como um livro de "mudança".
É enquanto "livro de mudança" que realmente o projecto melhor impacta o leitor. Será um dos muitos projectos ainda por revelar do espólio inédito, enquanto volume próprio embora semi-completo. Nesta perspectiva torna-se essencial para compreender o estado de espírito de Pessoa nos primeiros anos em Lisboa, sobretudo depois do Regicídio. O abandono do Curso de Letras levou-o a considerar a saída do país, mas é provavelmente a inquietação social (e a influência do seu tio Henrique Rosa) que o convencem do contrário, apesar da falta de amizades e estranheza em pertencer.
Os editores apresentam-nos uma edição difícil. Não porque os conteúdos sejam difíceis de entender mas antes porque se torna algo difícil de compreender a própria relevância do livro enquanto unidade externa. Este é um dos maiores riscos em editar Pessoa - será que o próprio autor consideraria o volume relevante? Na nossa opinião o volume está no limite dessa fronteira, mas apenas porque nos dá indícios de grande interesse sobre posteriores intervenções de Pessoa, nomeadamente os primeiros artigos na Águia em 1912. Sabemos, com cada vez maior clareza, que o Pessoa de 1908-12 é um jovem profundamente sonhador e interventivo, a clamar por mudança e sem pudor em avançar culpados pela estagnação do país.
Mas convenhamos que um livro onde Search começa por falar do Regicídio para depois debater o racionalismo e acaba em estranha discussão sobre a loucura de Jesus é um livro que pouca mudança poderia trazer. A mesma coisa acontece com Pantaleão, que escreve sobre uma espécie de psicose colectiva que invade o país, ou com Jean Seul desenvolvendo o tema do exibicionismo e da queda da civilização Francesa... O fio condutor de todos estes textos é ténue mas não invisível - é evidente que existem aqui temas que serão recuperados mais tarde e que mostram Pessoa enquanto grande pensador e não enquanto grande poeta (embora aqui também se achem esses exemplos, como a tradução exímia de sonetos de Camões para Inglês por C. J. Search).
Penso que não seja um acaso que Pessoa não terá tido grande preocupação em avançar com a publicação do livro na forma em que o projectou. Este livro deve ser visto apenas como um prolegómeno para outros escritos posteriores, nomeadamente os artigos da Águia em 1912. O grande valor do volume é assim, não o da unidade, mas o de nos poder revelar um Pessoa mais pensador que poeta, precisamente quando se inicia a sério na língua Portuguesa. Lembre-se que os seus primeiros textos editados em Português são textos que pouco ou nada têm de poéticos, são muito mais sociológicos e antropológicos. Se este livro reforçar essa noção de Pessoa enquanto pensador e não só poeta, terá com certeza feito um imenso serviço à herança cultural do autor. Pensamos que seja o caso.
Acedam aqui a uma amostra do conteúdo do volume. Esta obra pode ser adquirida aqui.
Um agradecimento aos autores pela cedência de um exemplar para análise.